terça-feira, julho 20, 2010

O Jardim Padre Fernando




Muito desejado e esforçadamente conseguido, foi inaugurado oficialmente no passado sábado um emblemático jardim público, cujo simbolismo, tal como o legado histórico que acumula, acresce ainda mais valor a esta forte marca da “nova Santa Clara” com que “Santa Clara – Vida Nova” sonhou. Se não, vejamos:
O lugar da ponta delgada, mais tarde Santa Clara, a extrema Poente da acentuada enseada que tem inicio na Ponta da Galera e o local que a meados do século XV foi berço de Ponta Delgada, três séculos volvidos voltou a revelar-se de primordial importância para o desenvolvimento comercial e industrial da cidade que entretanto já crescera e se consolidara como a maior dos Açores.
Os primeiros efeitos desta nova e importante fase de progresso de Ponta Delgada materializaram-se nas milhares de toneladas de pedra com que em Outubro de 1862 se deu início à construção do porto artificial da cidade, inertes todos saídos de uma pedreira cujos vestígios ainda são visíveis, um imenso veio de basalto que aumentando progressivamente em altura, praticamente desde a “Rocha da Nordela” até aos contrafortes da Clínica do Bom Jesus, ainda em finais do século XX como que exibia em retrato a rija essência do lugar.
Na transição do século XIX para o XX, com avultada actividade em 1902, das barrocas e runas resultantes da exploração das “Pedreiras da Doca” o Eng. Dinis Moreira da Mota projectou e impulsionou aquela que se destinava a ser a maior zona arborizada de Ponta Delgada: o “Parque da Alegria” como o seu criador admitiu chama-lo, “Parque Eng. Dinis da Mota” como oficialmente depois foi designado, “Mata da Doca” como todos em Santa Clara lhe chamavam, e assim ficou popularmente conhecida.
A frondosa e luxuriante “Mata da Doca” a partir de meados do século XX foi sendo aos poucos mutilada. Primeiro, na década de sessenta, com a construção dos depósitos da “Pol-Nato”, o que obrigou a destruir, talvez, o maior conjunto de araucárias da Europa. Depois, já em democracia, foi a “Pepom” que também ajudou a devastar e descaracterizar parte substancial do local. Para finalmente, já nas décadas 80 e 90, em consequência do prolongamento do aeroporto - que quase soterrou por completo aquela área - pouco faltar para todo aquele vigoroso pulmão verde desaparecer por completo. De facto, da imensa área que constituía a “Mata da Doca” (220.900 m2 registou com detalhe Gil Mont’Alverne de Sequeira em 1905) apenas sobrou o espaço que depois da espectacular requalificação de que foi alvo se transformou no “Jardim Padre Fernando”.
De regresso ao presente, ao aprazível jardim agora disponível para fruição da população de Ponta Delgada, em especial da de Santa Clara, é justo referir que um projecto com aquela envergadura só foi possível por constituir um muito cuidado e amadurecido fruto da cooperação entre uma pequena e jovem Junta de Freguesia e o Governo dos Açores, consequência de uma alargada conjugação de esforços a que alguns teimam em não aderir, com claro prejuízo para Santa Clara (é ver o modo de ocupação e gestão do Centro C. Santa Clara; foi - e é - o caso do terreno da Rua Dr. Filipe Alvares Cabral; foi - e é - a questão da derrocada na Cerca/Rocha da Nordela; foram - e são - os sucessivos atrasos na requalificação da 2ª Rua de Santa Clara; é o claro sentido de represália que isso, e muito mais, representam).
Relevante também é aquele espaço evocar o Padre Fernando Vieira Gomes: “o Padre Fernando de Santa Clara”, que pouco depois de chegado ao então humilíssimo curato logo sonhou com uma Santa Clara com outro estatuto, muito se batendo por este desiderato. Ele que soube fazer engrossar o exército dos que, durante mais cinco dezenas de anos, acreditaram na “realidade Freguesia” hoje vivida. Ele que premeditou, e hoje se comprova, que com Santa Clara independente tudo se tornaria mais fácil.
Até os sonhos levam menos tempo a realizar!

A.O. 20/07/10; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado)

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