sábado, março 14, 2015

Outros Marços


Quase cinquenta anos antes do Decreto de 2 de Março de 1895, diploma que o Açor fez chegar a Ponta Delgada sete dias depois, e que, não obstante a demora – nem a difícil vida de então – não deixou de ser saudado com vinte dúzias de foguetes… quase cinquenta anos antes do 2 de Março de 1895, dizia, um paladino da autonomia verdadeira, em missiva enviada de Londres (carta de 27 de Março de 1853: “Cartas particulares de José do Canto a José Jácome Correia”, ICPD, 1999), dava bem nota do que é lutar por tal objectivo; de como a autonomia verdadeira só se consegue com lucidez e uma crença tão visionária que, para muitos, até pode parecer utopia; de como, mais do que nos decretos, está na vontade e na inteligente persuasão a solução para a autonomia verdadeira; e, sobretudo, de como vale a pena sonhar e lutar pela realização do que se almeja (mesmo que seja muito mais que autonomia)!
Eis dois excertos da dita carta:

“ (…) Não concluirei sem te dizer duas palavras sobre o negócio da doca. Vim receber aqui a satisfatória notícia que o Ministério tinha proposto no Orçamento, entre outras reduções, a da Fruta (…) (…) pode dar-se como decidido este negócio: os negociantes calculam aqui
– Londres – que a redução virá a ser de 2 shelins em cada caixa grande. Parece pois que não havia melhor ocasião de levantar em S. Miguel um imposto sobre a Laranja, para a obra da doca: que o comércio e produtores ficassem com 1 shelin e que o outro fosse arrecadado para a obra, ainda a Laranja ficava aliviada (…).”
“Eu escrevi para Lisboa aos nossos Deputados a ver se o Governo Portuguez entrava com o Inglez n’uma convenção por onde garantisse que os impostos aplicados para a doca não teriam outro fim – diferente do financiamento da obra (…).”

E a carta continuava, tal como outras que se lhe seguiram, revelando mais “negócios de Estado”.
Nem cinco anos passados já “as obras da doca” haviam começado, e, só depois da doca, o dia do Decreto chegou! Imagino com gente desta como seria hoje? É que, muito mais do que “a doca” – e uma autonomia de decreto – há tanto em causa nos nossos dias: até o próprio mar!

AO. 14/03/2015; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado) 

sexta-feira, fevereiro 27, 2015

Gregos vs “Troikanos”



A mãe pátria da democracia – o berço de Clístenes e Péricles – chegou-se à frente e, à Syriza, colocou uma pedra na engrenagem que vê a austeridade como panaceia para todos os males de uma UE coxa e falha de líderes capazes de realizar alguns dos seus mais nobres objectivos: desenvolvimento sustentável assente em crescimento económico; combate à exclusão social; solidariedade e respeito mútuo entre os povos; erradicação da pobreza. 
Como sempre, na ausência de lideranças com envergadura, aparecem as "marionetes", gente incapaz de evitar, por exemplo, o “peso das botas” da Sra. Merkel ou “a chibata” do Sr. Schauble. Se o recente “bater de pé” dos helénicos vai mudar a situação, não sei. Só por si temo até que não! Fica porém a esperança de se ter aberto uma brecha na “frente alemã”, contribuindo para transformar esta “nuvem negra”, austera e já fazendo lembrar velhos tempos, em algo que reponha o sonho, traga ânimo, confiança: que nos volte a sintonizar com Beethoven e o seu "Hino à Alegria". Se é estreita a frincha conseguida pela Grécia? Sim, é! Mas também, não tendo sido a acção dos pequenos grupos de resistência o que determinou o fim da penúltima ocupação germânica, o seu contributo e coragem foi uma grande ajuda para a expulsão dos invasores. 
Mantêm-se o imperial sonho de alguns em dominar a Europa e o Mundo. Frustradas que foram as tentativas do século XX (1914/18 e 1939/45), o século XXI começou praticamente com uma terceira, sem recorrer a armas convencionais, claro, mas trocando-as por outra: o poder do Euro/Marco. A arma é diferente mas a arrogância e determinação de quem a usa recorda os déspotas do passado (só que agora sem o mini bigode). As recentes provocações do Sr. Schauble, até adjectivando de irresponsável o Povo Grego (eleitores e eleitos) são disso demonstração. Outro “todo-poderoso” daquelas bandas também começou por tratar com semelhante desdém os judeus e outras minorias. Tudo acabou como se sabe, não sem que, antes, mesmo já próximo do fim, também fossem vistos “meninos bem comportados” extasiados, porque fotografados ao lado do líder; o querido, o louvado, o idolatrado fuhrer! 

AO. 28/02/2015; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado) 

sexta-feira, fevereiro 13, 2015

O prometido é devido

 Planta do Forte de S. Pedro
 "O Forte e a Cidade", pág. 44,  de 
  José M. Salgado Martins (Edição Letras Lavadas, 2012).  


Recortes da cópia de um documento notarial de 1925 preparando a venda do "Castelinho de Santa Clara" e do Forte de São Pedro.


Foto aérea da zona do Forte de São Pedro (à esquerda), vendo-se ao centro a respectiva igreja.
Ponta Delgada: Vandalismo ou Desenvolvimento, pág. 46, de
Carlos Falcão Afonso (Edição CMPD, 2006).



Óleo sobre tela (Júlio Gomes de Menezes) onde se vê junto ao mar a muralha Poente do Forte de São Pedro.
História dos Açores II, pág. 153, de
Carlos Melo Bento (Edição do Autor, 1995).


O meu amigo Fernando de Jesus, nascido em São Pedro (logo, naturalmente, marítimista e portista fervoroso) mas “naturalizando” santaclarense por casamento, vai já para meio século, desafiou-me a escrever sobre o forte que existiu na sua freguesia, paredes-meias com o qual, disse-me, os avós possuíam a casa onde ele nasceu e viveu até ao início da década de cinquenta, altura em que a construção da avenida obrigou a demolir a residência da família – que ele gostaria de poder localizar e rever – tal como aconteceu a outras na mesma zona. Esta não é “a minha lavra” (fosse para as bandas “Loeste” e, talvez, lhe pudesse ser mais útil), mas como há coisas que estão ligadas… aqui vai disso:
Em 1925, o notário Tavares de Carvalho, de Lisboa, preparou a venda do “Castelinho de Santa Clara” (então avaliado em 2.320 escudos) e do Forte de São Pedro (bem mais valioso). O documento notarial (cuja cópia devo ao meu saudoso e bom amigo Comendador Manuel Ferreira) dá com detalhe as confrontações do Forte de São Pedro: Norte, adro da igreja de S. Pedro; Sul, mar; Leste, Rua do Castelo, Henrique Joaquim Botelho e Travessa do Calhau; Oeste, Dr. Luís Bernardo Leite Athayde. Para ajudar a esmiuçar o assunto recomendo uma interessante fotografia aérea da zona, publicada no livro do Dr. Carlos Falcão Afonso (“Ponta Delgada. Vandalismo ou Desenvolvimento?”, pág. 46) e a planta do Forte de São Pedro inserta no livro do Coronel José Manuel Salgado Martins (“O Forte e a Cidade”, pág. 44), conjunto de documentos que nos dão uma minuciosa percepção do local, com a foto oferecendo pormenores das residências em volta do castelo, onde, quiçá, poderá ser possível localizar a casa dos antecessores do meu prezado amigo.
Ficam para outras calendas as deliciosas “estórias” – reveladas pelo Fernando – sobre o “Ti Mané Miola” e o contrabando que fazia em volta da casa de sua avó, a “Tia Laurinha”, não podendo eu deixar de dar registo de que, mesmo que mais pequeno (só três canhoneiras enquanto o de São Pedro tinha sete) o “Castelinho de Santa Clara” – honra seja feita a “Santa Clara – Vida Nova”, já que a 1ª versão do PDM ignorava-o, convidando ao seu arrasamento – ainda lá está, enquanto do Forte de São Pedro restam apenas ilustrações.
Pois, Fernando, aqui fica um início para a meada. Agora é segui-la!

AO. 14/02/2015; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado) 

domingo, fevereiro 01, 2015

80 anos: uma vida



Em Maio de 1934, cumprindo a penúltima etapa da peregrinação encetada logo no seu primeiro mês devida (nos primeiros sete anos de existência o CDSC passou por sete diferentes sedes), o Clube Desportivo Santa Clara instalou-se num edifício com muito boas condições, localizado no “coração de Ponta Delgada” (esquina da Rua Machado dos Santos com a Rua Híntze Ribeiro: até recentemente a sede do Micaelense Futebol Clube). Um acordo – que por pouco não deu em fusão – com a SPER (Sociedade Promotora da Educação e Recreio) permitiu uma facilidade que, não fora a perspicácia de Manuel Inácio de Sousa, logo ali poderia ter descaracterizado aquele que já então dava passos significativos para um dia vir a ser o maior clube de futebol dos Açores (na época de 1933/34 o CDSC acumulou o seu 5º título consecutivo de campeão: 1 da LDM e 4 da AFPD).
Avaliada a situação, com uma congregação de esforços – uma das que mais tarde levaria António Horácio Borges (um homem do MFC) a proferir e eternizar a célebre frase: “o Santa Clara é o retrato da alma popular, um milagre de vontade” –, ainda antes do final de 1934 já o CDSC estava a efectuar as obras e adaptações para, a 31 Janeiro de 1935, ser oficialmente inaugurada a sede que, de então até hoje, nunca mais deixou de ocupar.
No ano seguinte, já com o Dr. Alberto Paula de Oliveira na presidência – substituindo o Capitão Reis Rebelo, primeiro presidente do CDSC (1927/1935) –, com pompa e circunstância foi celebrado o primeiro aniversário da “Nova Sede”. O brilhantismo da festa, tal como o de outras que se lhe seguiram, anos mais tarde (1949), acabou gerando o equívoco ainda hoje não completamente dissipado que confunde a data da inauguração da sede, 31 Janeiro de 1935, com a data de fundação do CDSC (remetida para o ano de 1921, depois de antes também serem referidos os anos de 1919 e 1920, em todos os casos enredando o CDSC com o “fenómeno Santa Clara”, a origem dos “Campeonatos de Santa Clara”, no qual as equipas das “lojas” do bairro se defrontavam renhidamente em regime de “desafio vs desforra”).
80anos, uma vida. Razão suficiente para repetir: “a nossa casinha, apesar de velhinha, é sempre a nossa casinha”!

Com os melhores cumprimentos,
Senhor Melo

AO. 31/01/2015; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado) 

sábado, janeiro 17, 2015

OLD PDL_1: O “Calhau da Areia”



1    -  Esquisso mostrando o perfil do "Calhau da Areia" antes dos aterros efectuados para a .......passagem das "locomotivas da doca". 
1.1 -  Localização do "Castelinho" (atenda-se à distancia entre este e a linha de água).
2    -  Planta mostrando o perfil do "Calhau da Areia" na década de cinquenta.
2.1 -  Localização do "Castelinho" (atenda-se à distancia entre este e a linha de água).
2.2 - Zona onde estava o "Cunhal da maré".
3    - Foto do "Calhau da Areia" na década de sessenta.
3.1 - Pormenor do "Cunhal da Maré".
4    - Foto do "Calhau da Areia" na década de oitenta.
5    - Foto do "Calhau da Areia" hoje.

A histórica enseada ainda lá está. Os habitantes locais chamam-na “Calhau da Areia”. Porém, areia, hoje, é pouca ou nenhuma a existente naquela antiga cala. Mas as diferenças não estão só na actual inexistência de areia. Se compararmos o que agora lá se pode observar com as descrições que desde o século XVI existem do local outras alterações são identificadas: a começar pelo seu perfil, antes uma cavada goleta entrando terra dentro até aos contrafortes do “Castelinho”, hoje uma elíptica alongada. Ao longo dos tempos, sobretudo a partir de meados do século XIX, com a construção do porto artificial de Ponta Delgada, vários aterros transformaram a sua forma original. Nem o “Cunhal da Maré”, imponente penedo que qual farol assinalava o zóster com melhor acessibilidade e mais protegido daquele anco, conseguiu resistir: foi mais uma - ainda recente - terraplanagem, para sobre ela alicerçar a inútil etar que lá se está a degradar, que o enterrou! Da primordial calheta apenas o seu comprimento se não alterou. Ela lá está, com a dimensão de antanho, espartilhada entre as duas pontas que sempre a definiram: a dos Algares, ou dos Aringas, a Nascente, a Delgada, ou de Santa Clara, a Poente. Duas extremidades pouco altas, progressivamente afundando-se mar adentro, que, basálticas que são, ao longo dos séculos se mantiveram firmes, determinando o início e fim da baía. Pequena, porém historicamente rica: Foi nela que desembarcavam os habitantes de Vila Franca, então Capital, quando para aquela zona vinham à caça de porcos bravios; Depois dos caçadores, e seguindo-lhes as pisadas, por aquela enseada chegaram também os primeiros habitantes a fixarem-se nesta latitude da ilha; Foi ainda naquele portinho que desde os primórdios varavam seus barcos os pescadores do pequeno núcleo populacional que está na origem da actual maior e mais importante cidade dos Açores!
Em Santa Clara, do “Calhau da Areia” até à Nordela, deverá estar a única parcela da costa da cidade que ainda mantém, quase inalterável, o recorte e as características que tinha, quando, em finais do século XV, por lá se fixaram os primeiros habitantes do lugar da ponta delgada. 
Que assim se mantenha!

AO. 17/01/2015; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado) 

domingo, janeiro 04, 2015

2015



Sem querer entrar em concorrência com os muitos “Zandingas” habituais desta quadra, confesso que, como já há muito não acontecia comigo, é grande a minha convicção de, finalmente, o “Ano Novo” poder vir a ser melhor que o “Ano Velho”!
Não. Não é que tenha “embarcado” na propaganda daqueles que não obstante ainda recentemente dizerem “se estar a lixar para as eleições”, agora, dopados pelo frenesim pré eleitoral, até dizem terem-se já dissipado as “nuvens negras” que eles próprios, contra tudo e contra todos, obcecadamente, se encarregaram de escurecer o mais possível (e não fora o Tribunal Constitucional, ainda maior seria o negrume!). 
Não. Definitivamente não “embarquei”, nem “embarco”, na tão cínica quanto enganosa “cantiga” do desafinado duo “Pedro & Paulo”, sonambulamente dirigido a partir do palácio de Belém. 
Esta minha convicção – a de, finalmente, podermos vir a ter um “Ano Novo” melhor do que o finado – é fundamentada numa premissa simples: depois de dois “anos horribillis” difícil será vir, logo de seguida, um terceiro ainda pior! O grave é se a lei das probabilidades não funciona! E os primeiros sinais não foram nada encorajadores: não foi que Ponta Delgada atrasou-se na entrada do ano? Atrasada e envolta em nevoeiro! E logo tudo isso a acontecer no ano em que, e tal como a minha convicção apontava, era grande a vontade para encontrar uma réstia de optimismo.
Bom. Ignoremos os presságios. Até porque o dia um já passou, hoje é dia três, amanhã será Domingo, e para principiar tivemos logo um feriado, uma Sexta e um Sábado, tudo de enfiada.
Que tenham TODOS um ano com muita saúde, próspero e feliz. Mas, não se esqueçam, isso só vai lá se cada fizer a sua parte! BOM ANO. 

AO. 03/01/2015; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado)