terça-feira, agosto 29, 2006

A nau que encalhou no lugar da ponta delgada


(Clikando aumentam)
Cartaz roubado aqui
e foto das três pontas; a da eira (farol) em primeiro plano, a da "Sardinha" a meio (quase no alinhamento do barco), e a da Galera, lá no horizonte à esquerda (só aumentando)


Aos que vão a Santa Clara nestes dias, sobretudo para aqueles que ao passarem pela “barraquinha da igreja”, olhando o mar e o horizonte (ao por do sol de preferência) conseguem ainda recordar a “Ponta da Sardinha” antes desta se ter tornado depósito de entulho, aqui fica uma pequena história.
Decorria o ano de 1597 (já D. António Pior do Crato havia falecido. É importante!), estava toda a costa sul da ilha cercada por naus inglesas, quando na manhã do dia 17 Outubro, à saída da missa, o Governador foi avisado que vinda de Poente, perto de terra, já aproximando-se do porto, navegava uma nau aparentando vir da Índia, logo, com valioso carregamento nos porões.
Sem perder tempo, foi o próprio governante quem atravessou Ponta Delgada a galope, e, já em Santa Clara, confirmando a missiva recebida e antevendo a nau já a ser pilhada, lamenta não ter como avisar a tripulação de que os navios que dela se aproximam são inimigos. Logo junto dele se apresenta um jovem, em calções, oferecendo-se para chegar a nado até à nau, para isso só aguardando ordens, e que lhe fosse transmitido o recado a dar. O governador emocionado e agradecido, abençoando-o, apenas lhe pede para avisar o pessoal de bordo do perigo que correm, sugerindo-lhes que o melhor que têm a fazer é entrar por terra adentro para por ali mesmo descarregarem o navio. O jovem lançou-se ao mar sem medo, e, “nadando como um golfinho” por entre as ondas, cumpriu com o que lhe fora confiado. O “inimigo” perdeu a nau, salvando-se a rica carga.
Chamava-se Apolinário. Apolinário Sarrão (Arquivo dos Açores, Vol. X pg. 131 e seguintes), e a sua missão bem que podia ser dada a qualquer um dos muitos jovens que ainda vi nadar desde o “Calhau da Areia” até avistarem o Relógio da Matriz.
“Coisa de rapazes de Santa Clara”!
Do próprio, in A. O. 29/08/06; “Cá à minha moda”

terça-feira, agosto 22, 2006

Uma demorada história



Tem sido enorme o “sururu” criado à volta da recente revelação de Günter Grass, na qual aquele seguidor de Beckett e Ionesco, em tempos (1999) galardoado com o Prémio Nobel da Literatura confessa ter sido membro de uma das mais temíveis unidades de elite do regime nazi. Num repente lembrei-me do muito que se disse e escreveu tendo por base assunto similar, porém sob pontos de vista antagónicos, logo depois de ter sido visto o fumo branco de transformou o Cardeal Joseph Ratzinger no Papa Bento XVI. É sempre bom nunca esquecer como pode ser injusta a história. Só depende do prisma por onde é olhada – ou nos é apresentada!
Por muita que seja a agitação do momento, estou convicto que nunca será um desvio juvenil – embora de grande significado como é o caso –, para mais praticado em época tão conturbada (final da II Grande Guerra), o que poderá desvirtuar uma longa carreira, também política, como é a de alguém que é considerado um dos maiores escritores alemães do seu tempo. Mas é exactamente esta enorme dimensão, quer a dada pelo seu legado literário, quer a intuída pela nobreza de carácter que a sua intervenção política transmitia, o que realça a infeliz forma como um intelectual de tal gabarito lidou com tão delicado assunto, mantendo “o segredo” na gaveta por mais de sessenta anos. Isto é hipocrisia. É imperdoável. Até causa um sentimento de alguma frustração!
No meio de tal turbilhão há duas questões para as quais gostaria de ter resposta:
Primeira. Teria o Nobel sido na mesma atribuído caso o segredo fosse antes conhecido?
Segunda. Foi o remorso, ou o fruto de uma bem delineada estratégia comercial, aquilo que agora trouxe à luz do dia a dolorosa nódoa?
Talvez qualquer dia a minha curiosidade seja satisfeita.
Do próprio, in A. O. 22/08/06; “Cá à minha moda”

terça-feira, agosto 15, 2006

Até que enfim; mas ainda é pouco!


Nº21 da Rua do Sacramento, à Lapa.
Lisboa - Portugal



Já não era sem tempo.
Só agora – e, a ter em conta as declarações do principal visado, ainda aguardando confirmação inequívoca –, mais de vinte anos depois de ter conhecido o seu primeiro momento, eis, finalmente, ter chegada a hora de colocar um açoriano na FLAD; A Fundação Luso Americana para o Desenvolvimento.
Criada em 1985, a FLAD é a face mais visível da última grande tranche, em “cash” (cerca de 85 milhões de euros), proveniente do Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os EUA, vulgo; “Acordo da Base das Lajes”, uma instituição que, tal como recomenda a velha tradição colonial, está comodamente instalada numa das zonas mais “chic’s” da “capital do império”, em palacete luxuosamente recheado, no qual, por designação de sucessivos primeiros-ministros, se tem vindo a providenciar digna acomodação a vários, e distintos, representantes da Nação. Açorianos, é que não! Até a soberba colecção de arte que possui, um must com cerca de 1000 obras, é bem representativa da discriminação "Luso Açoriana" praticada. Aliás, nada que não esteja contemplado na trama habitual; fiquem vocês, açorianos, com a fama (estou a lembrar-me da célebre cimeira Bush, Blair e “José Barroso”, ou, mais recentemente, do voo em cuja escala técnica ficou dispensada a confirmação do manifesto de carga) que para nós, portugueses, chega-nos e sobra o proveito.
Bom. Depois. Sim, depois, vêem os grandessíssimos “saca de aparas” (para mais informações, por favor, consultar: http://azorpress.blogspot.com/2006/08/os-dois-exemplares-da-fauna-ibrica.html), em longa cáfila, falar do que só conhecem à distância; dos “gangs” das ilhas - que actualmente garantem dimensão universal ao “rectângulo à beira mar plantado” –, da (não)justeza dos défices, ou, mais “inocentemente”, com bacocas comparações entre insularidade e interioridade. Passa fora!
Do próprio, in A. O. 15/08/06; “Cá à minha moda”

terça-feira, agosto 08, 2006

FIDELização


Graffiti ainda presente (Abril 2006) numa das paredes da Universidade de Havana. (a nitidez deve-se ao "milagre" produzido pela manipulação da foto).



Por maior simpatia que possa haver pela romântica personagem revolucionária que encarna – e eu tenho alguma –, é impossível poupar Fidel às consequências dos desvios por ele causados ao processo revolucionário doutrinado por José Martí, no entretanto subvertido pela ditadura de Batista, e que, assim esperavam, em 1959 retomaria o desejado curso natural.
De facto, quando se fala em “Revolução Cubana”, no imediato só nos ocorrem os nomes de Che, Fidel e mais uns quantos, alguns – o “misteriosamente desaparecido” Camilo Cifuentes por exemplo –, então, tão ou mais carismáticos do que o actual “grande comandante”, os líderes naturais de um mais ou menos alargado grupo populacional e de companheiros de armas, a quem se ficou a dever o esforço que permitiu derrubar o regime de Fulgêncio Batista. No entanto a verdadeira “Revolução Cubana” aconteceu quase um século antes (1868-1898), após longa campanha de luta pela emancipação da ilha ao jugo Imperialista Espanhol, período que depois de uma série de bem sucedidas expedições, com homens, armas e munições a chegarem regularmente dos EUA, culminou na “invasão libertadora”. Papéis importantes neste processo tiveram; O Partido Liberal Cubano, cuja divisa era; “autonomia como única solução prática e salvadora”, o Partido Autonomista, no qual se perfilavam os patriotas cubanos melhor preparados politicamente mas contrários a uma solução belicista, e o Partido Revolucionário Cubano, que, com José Martí (Pérez) como seu grande impulsionador, tinha – teve – como única finalidade conseguir a Independência de Cuba recorrendo à luta armada. A estes três partidos acresce ainda um outro, praticamente constituído por “peninsulares”, e demasiado comprometido com a defesa de resquícios esclavagistas; o Partido da União Constitucional.
Do próprio, in A. O. 08/08/06; “Cá à minha moda”

terça-feira, agosto 01, 2006

Contemplação



O Médio Oriente arde. O que se passa no Líbano é uma barbaridade. De parte a parte. E bárbaros também são todos aqueles que podendo fazer algo mais, nada mais parecem querer fazer do que insistir na retransmissão do seu lamento; do que chorar, hipócrita e cumplicemente, o desfecho de tão previsíveis acontecimentos!
Há pouco mais de dez anos, da última vez que calcorreei vários cantos daquela encruzilhada religiosa, iniciava-se então (com destaque para Jericó) o processo de transferência de poderes para a Autoridade Palestiniana, eu, ingénuo – mas também contagiado pela enorme tranquilidade que testemunhei existir em zonas tidas como “muito quentes” –, cheguei a pensar que, por fim, se aproximava a solução do problema. Imperfeita. Mas uma solução. A possível!
Há de facto problemas que parecem não ter (não querer ter) resolução!
Falta-me fé para acreditar que se possa compatibilizar, e racionalizar, tantos, e tão grandes, excessos de Fé.
Faltam-me também as palavras. Recorro a um "santo". Evoco a sua imensa sabedoria. Procuro recordar, de memória, uma das suas orações. Não consigo!
Dirijo-me ao seu altar do “Jardim do Colégio”. Lá está a prece. Releio. Copio. Partilho:

"Sonho de olhos abertos, caminhando
Não entre as formas já e as aparências,
Mas vendo a face imóvel das essências,
Entre ideias e espíritos pairando.

Que é o mundo ante mim? Fumo ondeando,
Visões sem ser, fragmentos de existências...
Uma névoa de enganos e impotências
Sobre o vácuo insondável rastejando...

E dentre a névoa e a sombra universais
Só me chega um murmúrio, feito de ais...
E a queixa, o profundíssimo gemido.

Das coisas, que procuram cegamente
Na sua noite e dolorosamente
Outra luz, outro fim só pressentido..."


Palavras sábias; até parecem ter sido escritas de propósito, também para isso!
Do próprio, in A. O. 01/08/06; “Cá à minha moda”