terça-feira, agosto 28, 2007

Sai-te mês de Agosto

Atípico. Sem chuva, quase sempre sombrio, mas sufocante. Praticamente desde o seu primeiro dia já cheirando a Outono – a meados do mês já o plátano aqui de casa parecia flutuar sobre uma carpete constituída pelas suas próprias folhas –, sem que no entanto nos permitisse beneficiar da frescura outonal, este mês de Agosto passou rápido que nem um raio (o Julho já assim fora), deixando por fazer quase tudo o que havia sido programado para ficar pronto até seu final. Não foi férias, nem falta de esforço. Antes fosse, pois por mais que lutasse contra a enorme “moleza” que me atormentou este Verão, pouco ou nenhum era o resultado visível, e quase nula a produtividade obtida.
É da idade, dizem-me! Como se fosse necessário lembrar. Porém, prefiro pensar que, talvez, tal qual como acontece com a natureza, também eu esteja a ser vítima do “aquecimento global”, ou do “efeito de estufa”. Do que quer que seja. Tudo menos admitir a lei natural das coisas, e reconhecer que parte substancial do problema está na PDI, síndroma facilmente detectado aos outros, mas que aos próprios, custa a identificar. Certo, certo é que este ano, até a minha habitual “neura natalícia”, zelosa maleita geralmente reservada só para os curtos, frios e escuros dias de Dezembro, parece ter chegado em Agosto. No pino do Verão!
Tardam os dias mais frescos. Nunca senti tanto a falta das brisas de Setembro. Nem sabem como desejo o Verão, mas o de São Martinho.
Quem sabe se chegou a hora – e a idade – de entender uma frase feita, bem entranhada no vocabulário popular, e geralmente usada quando algo não corre lá muito bem, o espontâneo; “sai-te mês de Agosto”.
Mas aprendi. Nunca mais me oponho ao poderoso ciclo natural; Agosto é para parar. Ir a banhos. Não compensa contrariar a mãe natureza.
Do próprio, in A. O. 28/08/07; “Cá à minha moda”

terça-feira, agosto 14, 2007

Entrevista

PO que pensa do actual momento político?
R
– O que se mete pelos olhos dentro de toda a gente: que nem os homens da Situação compreenderam ainda que estão a levar o país ao desespero, nem a Oposição se considera vencida ao cabo de trinta anos de opressão.
PJulga então que caminhamos para um ponto crítico da nossa vida colectiva?
R
– Pois julgo. O fosso que divide a família portuguesa torna-se de hora a hora mais profundo. E uma tensão desta natureza não se pode prolongar indefinidamente. É ver como basta que se abra uma fenda de expressão no muro de silêncio que nos empareda para que as duas metades se mostrem como são: uma a dar livre curso à sua indignação represada; a outra, aterrada perante a avalanche, a colmatar o rombo de qualquer maneira. (…)

Foram estas as duas primeiras perguntas, e respectivas respostas, formuladas ao médico Adolfo Correia Rocha com o intuito de serem incluídas numa entrevista escrita para o Diário de Lisboa – que não chegou a ser publicada por aquele jornal –, por morte de Carmona, estava então em curso a campanha eleitoral de 1951 (Craveiro Lopes, Quintão Meireles e Ruy Gomes).
Hoje, salvaguardadas as comparações; então a ditadura decorria à trinta anos, outro tanto tempo tem a actual democracia, a Miguel Torga, apartidário activista social, que já em democracia foi autor de alfinetadas do género; “fomos descobrir o mundo em caravelas e regressámos dele em traineiras. A fanfarronice de uns, a incapacidade de outros e a irresponsabilidade de todos deu este resultado: o fim sem a grandeza de uma grande aventura”, continuariam a não faltar razões para mais, e mais profundos lamentos.
O autor de “Bichos” não lamentaria porém, estou certo, as ausências institucionais que marcaram a celebração do centenário da data em que nasceu. “Pão Ázimo” já esgotou há muito.
Do próprio, in A. O. 14/08/07; “Cá à minha moda”