terça-feira, abril 27, 2010

175 anos do AO: muito mais que uma vida



O Açoriano Oriental comemorou, aliás, continua e irá continuar a comemorar ao longo do ano, o seu centésimo septuagésimo quinto aniversário.
São muitos anos, uma longa vida, tantos que faz dele o decano dos jornais açorianos, o mais antigo jornal escrito em língua portuguesa, e um dos mais antigos da Europa!
Tilintadas as “flutes”, libado o “champanhe”, remetidos de novo “para a naftalina” os trajes de gala, nada melhor para celebrar a obra do que aqui trazer, também, o seu criador.
Ao contrário do periódico que criou, Manuel António de Vasconcelos teve uma vida relativamente curta (1796-1844), em conturbados tempos, de guerra civil e mutação política. Este vigoroso açoriano, um fruto do meio rural micaelense, nado e criado na emblemática Bretanha, desde cedo convertido aos ideais liberais, e, nestes, militando com desmedido zelo – por vezes radicalmente – na sua margem extrema, foi um baluarte na defesa intransigente dos Açores, do seu Povo, em especial das suas camadas mais desfavorecidas. Entre outros testemunhos, isso mesmo se pode aferir nas suas muitas intervenções na Câmara dos Deputados, em Portugal, numa em especial, onde denunciando a fome que grassava nos Açores, e, simultaneamente, os que matando à fome aqueles que aqui trabalhavam a terra faziam lucro fácil com a exportação de cereais para Portugal, afrontou:

“ (…) que das produções dos Açores uma grande e considerável parte vem para Portugal, porque existem aqui muitos proprietários de lá, e é essa uma sangria que está desatada por onde se derrama o sangue dos podres dos Açores para Portugal (…)”.

Faz cada vez mais falta, quem, como Manuel António de Vasconcelos, combativo e não menos altruísta, servindo e não procurando servir-se, empenhando bens, saúde e até a própria vida, atenda defender as causas em que acredita, sobretudo quando nestas sobressaem as liberdades cívicas e a defesa soberana da terra que o viu nascer.
O “Açoriano Oriental”, açoriano sim, mas açoriano oriental também (não fosse ele herdeiro dos ideais emancipadores de 1821 - dissimulada na parede sob a sombra de velhos plantámos, lá está, em Santa Clara, na única rotunda por aqui existente durante muitos anos, dita “Rotunda da Autonomia” mas de facto Rotunda do Governo Interino, uma marca indelével da época), foi, também, quase sempre, o grande pendão da “Livre Administração dos Açores pelos Açorianos”. Bem vistas as coisas, antes da “Livre Administração dos Açores pelos Açorianos” se transformar no slogan que o 2 de Março de 1895 imortalizou, o Açoriano Oriental já apontava uma “livre administração” que pusesse fim à “livre exploração”, de que a “livre exportação” dos cereais era disso só um exemplo!
Talvez por isso, e também por ter sido assinado por quem foi, não deixa de ser significativo o título escolhido por um dos convidados de honra da edição comemorativa do 175º aniversário daquele que é um dos mais antigos jornais europeus: “Imprensa livre, Açores livres”.
Gostei. E muito mais gostaria se, acompanhando as cativantes palavras, tal como já antes o foram; “Governo dos Açores”, actos e acções eficazes as prosseguissem.
Regressado ao Açoriano Oriental, de agora, final desta primeira década do século XXI, permitam-me convosco partilhar o quanto me sinto honrado em, “cá à minha moda”, publicar num jornal cujas páginas outrora acolheu tão insignes açorianos, a começar pelo próprio Manuel António de Vasconcelos, mas também: Antero, Vitorino, Natália, e outros.

A.O. 27/04/10; “Cá à minha moda"

terça-feira, abril 13, 2010

O Sonho comanda a vida


Partilhar o sonho (01Setembro2007) .......Ver nascer a realidade (12 Abril 2010)

Deve ser uma tristeza, um “inferno”, viver sem sonhos. Pior mesmo, só passar pela vida sem capacidade de sonhar. Não me refiro a sonhos comezinhos, quimeras triviais, do tipo das que basta “estar parado”, crer, esperar sem nada fazer, pois de tão banais que são, será só uma questão de tempo o assistir à sua realização. Aludo isso sim, a sonhos amplos, aos sonhos que alavacam visões rasgadas, àqueles sonhos que muitos apelidam de utopias, e que, até, por vezes, durante muito tempo não passam disso mesmo: utopias! Sonhos que, é verdade, nem sempre se realizam, mas aquando da sua concretização “enchem a alma” e fazem transbordar de alegria os que ousaram sonhar, bem como também fazem esquecer as dificuldades, que sempre existem, e muito consomem, quantos se empenham em transformar o virtual em realidade palpável.
Estes sonhos, os grandes sonhos, os sonhos que assinalam a sua concretização muito antes desta ser visível a muitos, têm pelo menos três importantes momentos:
Primeiro. O sonhar propriamente dito. Uma ocasião descrita por António Gedeão em poema que para além de oferecer título a este texto, entre o muito mais, ensina-nos também isso: “quando o homem sonha / o mundo pula e avança / como bola colorida / nas mãos de uma criança”.
Segundo. O de lutar tenazmente pela concretização do sonho. Momento muito bem retratado num outro poema, lírica popularizada também pela voz do Padre Fanhais, cantando: “vem, vamos embora / esperar não é saber / quem sabe faz a hora / não espera acontecer”.
Terceiro. O assistir à realização do sonho (o que nem sempre acontece). É este o melhor momento, o mais gratificante, aquele em que os que passaram pelos dois anteriores – e só estes –, umas vezes alimentando a esperança que outros tentaram derrubar, outras, não menos significativas, cerrando dentes e fileiras por forma a ultrapassar os obstáculos e contratempos surgidos, podem, por fim, tactear, sentir, e continuar a sonhar, sim, mas agora já com o fruir do sonho que ajudaram a realizar.
Foi um destes momentos que se viveu, quase que por acaso, recentemente. E conta-se em poucas palavras:
Na passada quinta-feira, terminada que estava mais uma longa sessão de trabalho do grupo “Santa Clara – Vida Nova”, os últimos a dispersar, respondendo ao apelo de uma noite que a isso convidava, fizeram uma breve visita ao “Jardim Padre Fernando” que já está em adiantada fase de conclusão: Já lá estão montados alguns dos equipamentos de diversão infantil. Às poucas árvores, algumas seculares, que resistindo ao aterro se transformaram no pouco que restou da “Mata da Doca”, foram acrescidas largas dezenas – se não mesmo centenas – de outras. É imenso, contando-se aos milhares, o número de plantas e arbustos no entretanto ali plantados. Mas, é a qualidade do projecto, o bom gosto, o ar limpo e arejado que aquele local agora apresenta, aquilo que mais simboliza a marca da “nova” Santa Clara com que “Santa Clara – Vida Nova” soube sonhar.
Pode haver quem já não se lembre, mas há também quem não esqueça que há pouco mais de três anos aquele espaço mais não era do que uma “sala de chuto” ao ar livre, na sombra de araucárias, protegida dos olhares por moitas de silvas, recebendo dezenas de visitas por dia. “Sala de chuto” onde já nem faltavam, por perto, também camufladas entre silvados e arbustos, as barracas e outros abrigos clandestinos que estes lugares costumam atrair.

Felizmente já não é assim. O pérfido tornou-se benéfico. E não é sonho, é realidade!

A.O. 13/04/10; “Cá à minha moda"