domingo, abril 02, 2006

Um açor eterno

“Alto como as estrelas...
Livre como o vento”



Manuel Ferreira é o mais próximo – e legítimo – herdeiro da geração de açorianos, autonomistas, que nos legaram a ambição, profunda e visionária, de uma “livre administração dos Açores pelos açorianos”. Um herdeiro muitas vezes incómodo é certo, porém digno, leal, corajoso. O sucessor responsável, com verdadeiro espírito de missão, permanentemente mobilizado para a defesa da nobre causa – hoje mais que centenária – e que nunca vergou, nem desistiu. Um herdeiro que acima de tudo sempre se manteve seriamente comprometido com a “passagem do testemunho” às gerações seguintes!
Se assim aconteceu em democracia (tempos houve - será que algum dia deixarão de haver? -, já pós o 25 de Abril, em que fazer da coerência e frontalidade instrumentos de intervenção gerava custos elevadíssimos. Um preço muitas vezes difícil de suportar!), o mesmo já havia acontecido antes. De facto, quando o garrote da ditadura sufocava, dissimulado como “vidro moído” ao longo de um “inofensivo” conto, o seu inconformismo, ou, porque não dize-lo, a sua incontida revolta, souberam procurar o espaço possível, ficando claramente expressas, entre muitas outras, nas seguintes palavras de “O alevante da isca”:

(...) O pulha, com cara de tratador de porcos, anos antes destacado do continente para cá, como soldado raso e impedido do comandante da Guarda-fiscal (...)

(...) Lisboa só nos mandava daquelas encomendas (...)

“ (...) – Não há direito!
– Não há consciência! Cães danados!
– E fala-se em regalias... em autonomias...
– Qual autonomia, nem meia autonomia?
– Nem na nossa casa uma pessoa manda! (...) ”


Coragem que também demonstraram possuir na altura, 1948, os responsáveis pelo Instituto Cultural de Ponta Delgada, atribuindo ao então ainda jovem Manuel Ferreira, o distinto primeiro lugar num dos prémios em concurso.

Apetece “deixar-me perder” por outros caminhos. Por exemplo: como, quando ainda imberbe, sem nunca me haver cruzado com o já insigne jornalista, pelo simples facto de acompanhar nos jornais a polémica por ele sustentada a propósito da demolição do antigo edifício das finanças, fiquei seu fidelíssimo leitor, “completamente agarrado” a um estilo, destemido, frontal, contundente, mas sempre muito consistente; ou como, pouco tempo depois, mas ainda antes de “O barco e o sonho” – que comprei quase como de “obra clandestina” se tratasse – ter ganho a popularidade de que hoje goza, aquele livro já era um dos meus documentos de culto; ou ainda como..., e como... não. Não!
Passemos imediatamente a este colossal monumento à açorianidade que é O AÇOR ETERNO.

Não me preocuparei com palavras bonitas. Elas não faltarão, tenho a certeza, vindas de quem, muito melhor do que eu, as saberá usar.
O que não posso, o que não quero, aquilo de que nunca me perdoaria se o não fizesse, é, publicamente, deixar de dar conta do meu agradecimento por mais este compêndio de açorianidade, pelo titânico exemplo de tenacidade e abnegação que foi o acto de levar “este colosso” ao prelo, pelo inexcedível esforço – pequenas parcelas do qual me foi dada a felicidade de testemunhar – dispendido para completar a trilogia que também inclui “A Simbologia do Açor na heráldica dos Municípios Açorianos” (1996), e “Açores – Origens, Raízes e História” (1999).
O AÇOR ETERNO é o assumir da incapacidade de um dia dar por concluída a completa catalogação do ícone que a açorianidade disseminou pelo mundo. Mas é também, simultaneamente – e sobretudo –, a mais adequada moldura para uma tese que o seu autor com ele nos apresenta:

“O Açor só aparece como verdadeiro ícone e constante arma de combate, com o triunfo da Autonomia Administrativa de 1895”.

Também por isso; BEM HAJAS COMENDADOR MANUEL FERREIRA.
(Texto publicado hoje - sem que tivessem retirado as referências feitas quanto a "bold's", "itálicos" e outros que tais - no Açoriano Oriental.)
E, para trazer o assunto para o âmbito do OLDPDL;
Eu e o Sr. Comendador Manuel Ferreira, num qualquer dia de um dos primeiros anos do século XXI, quando lhe fui dar a conhecer – fisicamente – o Castelinho de Santa Clara.
Estava então em preparação o livro: “As voltas que Santa Clara deu”. São fotos que guardo com grande empenho, uma delas em “passe-partout” na minha biblioteca.