terça-feira, julho 05, 2011

Açorianos vs ingleses: a primeira vinda da RAF a Ponta Delgada


Foto (imprensa da época) da equipa da RAF, e brazões dos dois Esquadrões RAF que em 1945 e 1946 estiveram nos Açores


Hoje em dia já são poucos aqueles que podem testemunhar – ou se recordam – do que era, nos Açores, disputar uma partida de futebol após uma longa viagem de barco. Tempos houve em que com alguma regularidade (anual) as disputas entre equipas de diferentes ilhas, de forma especial entre as de São Miguel, Terceira e Faial, só se faziam após longas horas de navegação, não sendo assim tão raras as ocasiões em que o jogo se realizava logo após o desembarque. Recuando um pouco mais no tempo, o mesmo também aconteceu com a disputa de jogos entre açorianos e madeirenses, e, embora ainda mais raramente, e com viagens mais difíceis e longas, há também os casos das viagens marítimas de alguns clubes portuguesas aos Açores, e de outros tantos açorianos a Portugal. São disso primeiros exemplos a vinda aos Açores do “Casa Pia” (em 1921, então Campeão de Lisboa em título), e a ida do Clube Desportivo Santa Clara (em 1935, já Pentacampeão Micaelense: uma notícia anunciando-o em Portugal como “Campeão Açoriano” em título despoletou uma polémica de enorme grandeza) para a alargada digressão durante a qual defrontou, ainda no Campo das Amoreiras, o S. L. Benfica, naquele ano Campeão de Portugal (derrota por 11-2, com 4-2 ao intervalo).
O transporte aéreo veio facilitar, e muito, o intercâmbio desportivo (não obstante ainda hoje em dia as viagens serem apontadas como forte handicap), datando de 1945 a primeira vez que o futebol, nos Açores, usou o avião como meio de transporte.
De facto, completam-se esta semana 66 anos sobre a data em que uma equipa da Royal Air Force, vinda da Terceira, aterrou em São Miguel expressamente para disputar dois jogos de futebol.
A iniciativa – numa primeira fase fruto de contactos estabelecidos entre a Direcção do Clube Desportivo Santa Clara e o Delegado Marítimo Britânico em Ponta Delgada – que depois de cuidadas e diplomáticas diligências acabou rapidamente passando para o âmbito da Associação de Futebol de Ponta Delgada, obrigou a organização de duas selecções locais, “Os prováveis” e “Os possíveis”, esta última maioritariamente constituída por jogadores do CDSC: Mariano de Sousa, Manuel Pedro, Manuel de Sousa (Americano), Artur de Sousa (Garalha), João Vicente (Ratana) e José Vicente. Integraram ainda “Os possíveis”: João Maciel, Alírio Fontes, Manuel Azevedo, Tomás Azevedo (Talefa), todos do Micaelense Futebol Club, e António Duarte do Marítimo Sport Club.
Na equipa “Os prováveis” destacavam-se: Armando Goyanes, Manuel Salsa, Bento Macedo, Manuel Maria, Reinaldo Simões, Alberto Ferreira, Hélder Miranda, Humberto Correia, João Casanova, João de Medeiros e Norberto Pacheco. Uma e outra contavam ainda, como suplentes, com: José Pacheco, Manuel Luís, Carlos Lopes, Hugo Correia Machado e Francisco da Costa Santos.
A equipa da RAF valia desportivamente quase tanto quanto o valor tecnológico do meio de transporte que utilizou, integrando-a os seguintes jogadores: Harrison, Burton, Grant, Potter, Nudle, Gilloney, Nuncie, McAnally, Bowers, Mitter e Lambert, sendo os cinco últimos todos jogadores profissionais, e Lambert, para além de profissional, um dos notáveis internacionais ingleses de então.
O resultados dos dois jogos disputados – 6/1 no da estreia contra “Os possíveis”, e 2/0 dois dias depois contra “Os prováveis” – espelharam bem a diferença do futebol patenteado por ambas as partes, rezando as crónicas que foi João Maciel, e as suas espectaculares defesas, o que mais contribuiu para o aparente equilíbrio do derradeiro e mais aguardado jogo.

A.O. 05/07/2011; “Cá à minha moda" (revisto e acrescentado)